Entende?

existe algo que me toma, que me machuca, que arde e desconforta cada vez que vejo que seu mundo não gira só ao meu redor. A garganta aperta, o peito dói e eu não sei dizer da onde vem a insegurança de perder algo que não é meu e nem nunca será. Mas o desconforto persiste, a dor insiste e eu me contorço em caprichos tentando lembrar de todas as vezes em que achei que você me pertencia, só para acalmar um coração infantil, imaturo e mimado que não sabe viver o amor sem aprisionar.

tão logo breve instante

eu não sei dizer. Respiro fundo e tento tirar minha mente do futuro.
Aproveite o momento, Dora. Aproveite o momento.
Eu olho para você e você sorri para mim.

- acho que já vou embora...
- você não tá feliz aqui?

E você não percebe que esse é o todo o problema. Eu estou muito feliz aqui. Eu passaria semanas em cima dessa cama, colocando e tirando a roupa, entre beijos, sexo, risos e histórias.

Respiro fundo. Estabeleço um horário. Eu vou às 3.

São 6. De repente, tempestade. Eu não trouxe guarda-chuva. Eu não gosto quando chove. Chuvas de verão e paixões passam rápido.

Respiro fundo. São 7. A chuva só piora. Eu quero fugir dali, correr desesperadamente. Deixa a chuva gelada me molhar, me acordar, me lembrar que é muito cedo para eu já te querer tanto.

Te puxo para perto de mim e parece que não há superfície de pele suficiente para saciar minha vontade de você. Te mordo, te aperto. Respiro fundo. Já são 8.

- eu realmente preciso ir.

Porque querer, eu não quero. Mas de alguma forma eu preciso provar para mim mesma que ainda tenho um mínimo de controle.

Eu vou com cada parte de mim querendo ficar.
Aproveite o momento, Dora. Aproveite o momento.

Eu não falo amor.

eu queria saber ser desapegada. Porque eu imagino que o amor demanda desapego. Porque eu acredito que o amor não tem condicional. Então, eu finjo ser desapegada. Eu finjo que eu não ligo que você já ficou com aquela menina logo ali sentada. Eu rio da situação. Rio de você ter se dado o trabalho de me contar. E por que, em um milhão de anos, isso seria uma informação necessária para alguém? Mas dentro de mim não há risos. Há contradição. É lógico que você não nasceu ontem. Nem anteontem. Você vem junto com uma história que você viveu nos seus vinte e poucos anos antes de sequer saber que eu existia. E nessa história inclui-se uma noite em que você ficou com aquela menina logo ali sentada de pernas cruzadas. Você ensaia uma justificativa qualquer por ter ficado com ela. A emenda fica pior que o soneto.

e eu já imagino que aquilo não vai dar certo de maneira nenhuma. Como eu posso ter um relacionamento com uma pessoa que já ficou com aquela menina ali sentada de pernas cruzadas e blusa clara? Por fora, eu sorrio. Mudo de assunto. Já viu como a lua está bonita hoje? Mas dentro de mim, eu não consigo tirar da mente aquela menina ali. Agora nem sentada ela está mais. Suas pernas já estão esticadas. Mas eu a continuo olhando de soslaio.

e penso que você me causa insegurança demais, medo demais, vontade demais. E eu te odeio porque contra todas as minhas generalizações, você faz questão de falar comigo todo dia. Morro de raiva que a gente tenha acordado e você tenha me dado um beijo de bom dia e tenha aberto a porta para mim para que eu pudesse voltar.

E eu odeio que mesmo você sendo quem você é, nesse tão pouco tempo [quanto tempo é pouco tempo?], mesmo a gente estando bem, e você ainda não tendo me dado motivos para duvidar, a única coisa que eu lembre seja a forma cáustica e erosiva que eu sei experimentar o amor.